quinta-feira, 11 de setembro de 2025

Sociedade e família na jornada da fertilidade: remédio ou veneno?

*Thalyta Laguna


O sofrimento psíquico de quem tenta engravidar não pode seguir sendo deslegitimado. Foto: Pexels


Nem sempre o desejo de ter um filho se concretiza no tempo ou da forma que se imaginava. Quando as tentativas não resultam em gravidez, o impacto não se limita aos tratamentos: saúde física e mental, relacionamentos, autoimagem e vínculos familiares são colocados à prova. Esse peso se torna ainda maior porque, culturalmente, a infertilidade continua sendo vista como um problema do corpo feminino. Essa percepção distorcida direciona o olhar para as mulheres e concentra nelas a maior parte da responsabilidade emocional, clínica e simbólica do processo. 

Em cerca de 40% dos casos, a infertilidade decorre de fatores masculinos. Ainda assim, as mulheres são, na maioria das vezes, as primeiras a serem investigadas, medicadas, examinadas e cobradas. A pressão se acumula dia após dia, e o sofrimento se deposita não apenas em seus corpos, mas também em seus pensamentos. 

Isso não significa que os homens não sofram. Eles sofrem, muitas vezes, calados; e, por falta de espaço ou por exigência cultural, tendem a internalizar suas angústias. Mas, mesmo quando o sofrimento está presente dos dois lados, a resposta social à infertilidade é desigual: enquanto os homens são poupados de perguntas e julgamentos, as mulheres seguem como principais alvos da cobrança. Espera-se que estejam disponíveis, resilientes e preparadas. E, quando a pressão vem mascarada de conselhos que nada acrescentam, é a saúde mental feminina que sente o impacto primeiro. 

No espaço familiar, onde se esperaria proteção, surgem cobranças veladas. Perguntas sobre “quando virão os netos”, comparações com outras gestações e sugestões genéricas sobre fé ou paciência contribuem para uma sensação de inadequação que adoece. Ainda que muitas dessas falas partam do desejo de ajudar, operam a partir do senso comum, ignorando a complexidade emocional da infertilidade. 

É preciso romper esse ciclo. O sofrimento psíquico de quem tenta engravidar não pode seguir sendo deslegitimado. Cada tentativa frustrada representa uma perda real, e o luto não é menor só porque não pode ser visto. A família pode ser parte do problema, mas também da solução. Validar as emoções, respeitar o tempo e o processo alheios e evitar pressões são formas concretas de cuidado. 

Ao fim e ao cabo, vale a máxima: há silêncios que sustentam mais do que mil discursos. Pois, na maior parte das vezes, não é a ausência de palavras que machuca, e sim o excesso delas, ditas para calar o próprio desconforto.  

Se não souber o que falar, ofereça um abraço. Ele costuma dizer tudo. 

*Autora de “Muito além do positivo”, Thalyta Laguna é psicóloga perinatal e pesquisadora na área de saúde reprodutiva. 



quinta-feira, 4 de setembro de 2025

Voz e resistência: "Nasci Odara" revela uma história real de luta, amor e transformação

Em livro, a escritora Ana Marice Teixeira Ladeia reconstrói a trajetória de uma mulher trans preta em narrativa que transita entre depoimentos íntimos e reflexões críticas, elucidando pautas como redesignação de gênero e direitos humanos



O livro Nasci Odara, da médica, pesquisadora e escritora Ana Marice Teixeira Ladeia, é mais que um relato biográfico: é um testemunho vivo sobre resiliência, amor e a potência de existir plenamente. A obra nasceu do encontro entre a autora, branca e cisgênero, e Odara, mulher trans, preta e periférica, cuja história rompe o silêncio imposto pela marginalização e pela violência estrutural. 

Ao longo das páginas, Ana Marice se coloca no lugar de escuta, deixando que Odara conduza o fio narrativo. Entre memórias, dores e conquistas, a protagonista revela uma trajetória marcada por enfrentamentos e afeto, onde o amor – seja materno, romântico ou próprio – surge como força de sobrevivência.  

Vivo como se eu não fosse uma pessoa inteira e real. Sinto que existem dois mundos, o mundo que transborda dentro de mim e que já não cabe no meu corpo e o mundo dos que me veem e me julgam. Tenho vomitado tudo que como. Vomito muito mais que comida, vomito dores, preconceitos e a hipocrisia da sociedade. (Nasci Odara, p. 41)  

A narrativa transita entre depoimentos íntimos e reflexões críticas sobre gênero, preconceito e direitos humanos, além de trazer informações claras sobre o processo de redesignação de gênero, fruto de entrevistas da autora com outros médicos e psicólogos. Assim, Nasci Odara se torna também um instrumento de conscientização, ao desmistificar conceitos e ampliar o diálogo sobre diversidade e inclusão. 

Me diziam que eu não tinha lugar de fala até que resolvi assumir que eu tinha sim lugar de fala, porque tive lugar de escuta e tenho lugar de escrita”, afirma Ana Marice. Segundo ela, o livro surge justamente como uma ferramenta de ampliar a voz dessas mulheres. 

Ao final, a relação entre narradora e protagonista transcende a escrita: ambas se reconhecem nas emoções compartilhadas. Com linguagem sensível e comprometida com a verdade, Nasci Odara se firma como um convite ao respeito e à empatia – e como prova de que contar histórias é também um ato político e de amor. 

FICHA TÉCNICA 
Título: Nasci Odara 
Autor: Ana Marice Teixeira Ladeia 
ISBN: 978-65-5625-670-2 
Páginas: 94 
Preço: R$ 40,00 
Onde comprar: Amazon 

Sobre a autoraAna Marice Teixeira Ladeia construiu uma trajetória marcada pela dedicação à medicina e à literatura. Médica cardiologista, é doutora em Medicina Interna e professora titular da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, onde também coordena o Programa de Pós-Graduação em Medicina e Saúde Humana. Já publicou mais de 135 artigos científicos. Na literatura, transita entre prosa e poesia, explorando temas de amor, superação e questões sociais. Autora de Do amor e do amar: histórias de mulheres reais como você e Nasci Odara, finalista do Prêmio Kotter de Literatura, teve obras traduzidas para o espanhol e lançadas internacionalmente.  

Instagram@anamariceladeia 

 

terça-feira, 2 de setembro de 2025

Em 'Vale tudo', Afonso descobre que está com leucemia: entenda a doença que terá mais de 11 mil casos este ano

Novela reacende discussão sobre um dos tipos mais comuns de câncer hematológico e reforça necessidade de atenção aos sintomas


Afonso descobre câncer. Foto: Divulgação/TV Globo

Na nova versão de “Vale Tudo”, exibida pela TV Globo, o personagem Afonso (Humberto Carrão) foi diagnosticado com leucemia mieloide, em uma sequência inspirada na clássica cena de “Laços de Família” em que Camila (Carolina Dieckmann) raspa os cabelos durante o tratamento contra a doença. A reinterpretação reacende o debate sobre um tipo de câncer que afeta milhares de brasileiros todos os anos e ainda é cercado de dúvidas.

A leucemia mieloide é um tipo de câncer que se origina na medula óssea, local responsável pela produção das células do sangue, e pode ser classificada como aguda ou crônica, dependendo da velocidade com que as células doentes se multiplicam.

Sobre o tratamento, Mariana Oliveira, onco-hematologista da Oncoclínicas, destaca que ele pode incluir quimioterapia, terapias-alvo, medicamentos orais e, em alguns casos, transplante de medula óssea. “O diagnóstico precoce e o acompanhamento com equipe especializada são fundamentais para o sucesso do tratamento e para oferecer a melhor qualidade de vida ao paciente”, afirma a especialista.

Outro ponto de atenção abordado na novela é a queda de cabelo durante o tratamento. “A queda dos fios não é provocada pela leucemia, mas é um efeito colateral de alguns tratamentos”, esclarece Mariana.

Entenda a doença

Dos tipos de câncer que afetam o sangue, a leucemia é a mais conhecida. A idade de acometimento varia de acordo com o subtipo da doença, que, em linhas gerais, se divide em mielóide e linfóide, de acordo com a célula afetada. Em ambas as categorias, ela pode ser qualificada como sendo aguda ou crônica, considerando a velocidade de divisão dessas células e, portanto, a agilidade com a qual a doença se desenvolve.

As Leucemias Agudas podem ocorrer em todas as faixas etárias sendo que a LLA (Leucemia Linfóide Aguda) tem maior incidência na infância e juventude. Já a Leucemia Mielóide Aguda (LMA) é o tipo mais comum de Leucemia em adultos, correspondendo a 80% dos casos neste grupo. A ocorrência de LMA aumenta com a faixa etária (maior incidência acima de 65 anos). Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), no triênio 2023-2025, são estimados 11.540 novos casos a cada ano no Brasil - sendo o 10º tipo de câncer mais frequente entre a população brasileira

"A Leucemia é desencadeada por mutações genéticas nas células hematopoiéticas, responsáveis pela produção das células sanguíneas (glóbulos vermelhos, brancos e plaquetas). Estas mutações fazem com que a célula hematopoiética passe a produzir uma grande quantidade de células anormais, que não conseguem amadurecer e desempenhar sua função normalmente, ocupando a medula óssea e impedindo que células normais sejam produzidas", explica a especialista.

Segundo Mariana, a doença não se trata de uma condição hereditária, mas sim de alterações genéticas adquiridas e que acabam por desencadear o surgimento do câncer. "Infelizmente, não existe uma forma de prevenção. Porém, é importante estar atento e procurar um médico sempre que tiver algum dos sintomas. Assim, será possível fazer os exames diagnósticos com rapidez e escolher o tratamento mais adequado para cada caso", destaca Mariana.

Fique atento aos sintomas

Alguns fatores, como a exposição a produtos químicos, principalmente os derivados de benzeno, e à radiação em altos níveis, assim como algumas doenças genéticas como anemia de Fanconi e outras que afetam o sangue, podem elevar o risco de incidência da doença. Ainda assim, estes são apenas fatores que podem contribuir para o surgimento da leucemia, mas não são regra. Diante disso, o principal conselho da onco-hematologista é que seja dada atenção aos sinais que podem ser indícios da doença.

"Os sintomas das leucemias agudas incluem palidez, cansaço e sonolência, uma das consequências da queda na produção de glóbulos vermelhos (hemácias) e consequente anemia. Manchas roxas que surgem aparentemente sem traumas, pequenos pontos vermelhos na pele e/ou sangramentos mais intensos e prolongados após ferimentos leves também podem surgir em decorrência da diminuição na produção de plaquetas", comenta a médica.

A redução na imunidade ocasionada pela baixa quantidade de glóbulos brancos faz com que a pessoa apresente infecções constantes e febre. "Dores ósseas e nas juntas, que podem dificultar a capacidade de locomoção, e dores de cabeça e vômitos são outros possíveis sintomas que não devem ser ignorados. Outro indício da doença pode ser ainda a perda de peso", afirma Mariana Oliveira.

A onco-hematologista da Oncoclínicas frisa, contudo, que as leucemias crônicas são comumente descobertas por alterações identificadas no hemograma - exame de sangue que deve ser realizado periodicamente como parte da rotina, já que dificilmente apresentarem alterações evidentes à saúde. "Apenas em estágios mais avançados podem ocorrer sintomas similares aos casos agudos", pontua.

Para fechar o diagnóstico, é recomendada a coleta de medula óssea para exames específicos (mielograma, biópsia, imunofenotipagem e cariótipo). Outros estudos complementares podem ser então sugeridos, de acordo com a subclassificação a ser estabelecida e análise de risco, para que seja assim definido o tratamento a ser adotado. 

Como funciona o tratamento para leucemia?

Logo de cara, quando se fala em leucemia, é quase inevitável pensar no transplante de medula óssea. Mas, ela é muito mais ampla do que os casos que realmente necessitam desse procedimento. Em muitos pacientes, o tratamento pode ser medicamentoso ao longo de toda vida, ou ainda a partir da própria quimioterapia, capaz de eliminar a doença.

Podendo ser agudas (leucemia linfóide aguda e leucemia mieloide aguda) ou crônicas (leucemia linfocítica crônica e leucemia mieloide crônica), elas são definidas da seguinte maneira:

  • Leucemias agudas: necessitam de internação, exames de classificação e testes da medula óssea para a escolha da quimioterapia adequada ao paciente. Geralmente, a multiplicação das células mutadas é rápida e é mais comum em crianças.
     
  • Leucemias crônicas: possui um desenvolvimento lento e pode acompanhar o paciente ao longo de toda a vida, sem maiores complicações. Na maioria dos casos é mais comum em adultos e seu tratamento é realizado com consultas de rotina e prescrição de remédios.

"Temos que lembrar que os avanços nos tratamentos tiveram um salto importantíssimo. Um deles é a terapia car-t cell, em que os linfócitos do tipo T são tratados em laboratório para que possam analisar e reconhecer as células cancerosas, eliminando-as", comenta.

Além disso, a leucemia possui altas chances de cura, podendo chegar a até 90%, no caso das crianças, e 50% em pessoas até 60 anos. "Apesar de não existir cura para alguns casos da doença, os tratamentos são eficazes para oferecer uma maior expectativa e qualidade de vida. Por isso, o diagnóstico precoce é fundamental para o controle da leucemia", finaliza Mariana Oliveira.


Enem 2025: Dicas para se destacar na prova

Coordenadora pedagógica da Rede Enem apresenta dicas práticas para alunos enfrentarem a reta final com confiança e equilíbrio


Foque no que mais cai na prova. Foto: Pixabay

A menos de 70 dias para o Enem 2025, milhões de estudantes intensificam a preparação para o exame que pode definir o futuro acadêmico. Segundo dados do Inep, mais de 3,9 milhões de candidatos realizaram o Enem em 2024, o que consolida o exame como a principal porta de entrada para o ensino superior no Brasil. O grande desafio, especialmente para os alunos do Ensino Médio, está em equilibrar a rotina escolar com os estudos para o Enem, sem comprometer o desempenho ou a saúde emocional.

Juliana Evelyn dos Santos, coordenadora pedagógica da Rede Enem, lembra que o segredo está na organização e constância. “As palavras-chave para conciliar esses dois grandes objetivos são organização, constância e treino. O ideal é que cada estudante monte seu cronograma semanal de estudos, distribuindo as matérias que ele irá estudar e revisar de maneira equilibrada, intercalando matérias mais fáceis com aquelas que ele tem mais dificuldade”.

Pensando nessa reta final, a profissional responsável pela curadoria do conteúdo pedagógico da Rede Enem, uma das principais plataformas de educação digital gratuita para preparação do Exame Nacional do Ensino Médio, dá 5 dicas para os alunos se prepararem:

  • Organize um cronograma realista: Planeje os estudos semanalmente. Intercale conteúdos mais fáceis com os mais desafiadores e inclua períodos de descanso, exercícios físicos e lazer para evitar o esgotamento mental. 
  • Foque no que mais cai na prova: Revisar os conteúdos mais cobrados no Enem ajuda a direcionar os esforços de maneira eficiente. Além disso, buscar sanar dúvidas ao longo do caminho otimiza o aprendizado.
  • Aproveite as aulas regulares: Ver as aulas da escola como uma extensão da preparação para o Enem é um diferencial. “O estudante deve organizar seu cronograma de modo que revise e faça exercícios dos conteúdos vistos na escola e intercale com os pontos importantes de revisão, como os conteúdos que mais caem em cada disciplina no Enem”, recomenda Juliana.
  • Pratique simulados: Realizar simulados ajuda os estudantes a treinar o tempo e a resolver questões no estilo do Enem. Essa prática também auxilia na familiarização com o formato da prova e fortalece a resistência mental.
  • Cuide da saúde física e emocional: Dormir bem, manter uma boa alimentação e praticar atividades físicas são tão importantes quanto estudar. Dedicar tempo ao lazer também é essencial para recarregar as energias e reduzir o estresse.

A mestra e doutoranda em Educação reforça que o exame exige mais do que apenas conhecimento técnico. “O estudante deve organizar seu cronograma de modo que revise e faça exercícios dos conteúdos vistos na escola e intercale com os pontos importantes de revisão, como os conteúdos que mais caem em cada disciplina no Enem." conclui a especialista da Rede Enem.

Para saber mais sobre a Rede Enem acessehttps://redeenem.com.br/